quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Dívida Da Empresa E O Patrimônio Dos Sócios

O patrimônio dos sócios e administradores só pode garantir ou efetivamente pagar as dívidas fiscais da empresa se ficar comprovado que houve a prática de atos ilegais por parte destes.
Assim é a posição do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o tema em favor de uma empresa paulista que conseguiu tirar da mira do fisco federal o patrimônio de seus sócios, ameaçado por causa de débitos tributários da companhia.
Ora, sobre esse tema já temos árduo trabalho desde há muito e, com justiça, parece que se tornará realidade, pois enquanto não haver comprovação de deslizes dos administradores na condução dos negócios, vazio é o fundamento da Fazenda da União, Estado ou Município para querer redirecionar suas cobranças aos sócios.
Reforça nossa sustentação a decisão da ministra Denise Arruda que tem base em precedente aberto em março pela 1ª Seção. No julgamento do primeiro caso sobre a questão com base na Lei de Recursos Repetitivos, os ministros concluíram que “a simples falta de pagamento do tributo não acarreta, por si só, a responsabilidade subsidiária do sócio na execução fiscal”. Desde então entendem que é preciso haver provas de contudentes de atuação “dolosa ou culposa na administração dos negócios” para que se possam responsabilizar os sócios e/ou mandatários, através do redirecionamento da ação judicial de recuperação dos créditos tributários.
Para a desconsideração de personalidade jurídica de empresas ou responsabilização direta dos sócios muitos dos requisitos necessários vêm sendo ignorados pelo fisco.
Estamos notando que está se tornando rotina a inclusão dos sócios no pólo passivo das execuções ou a inclusão dos sócios nas Certidões da Dívida Ativa.
A Fazenda usa este ardil quando está diante da impossibilidade de localizar bens da empresa e sem qualquer procedimento prévio e com a imediata penhora dos bens dos sócios, pois considera o não pagamento de tributo como infração à Lei, na tentativa de levar o Judiciário a confundir fraude com mero insucesso empresarial ou impontualidade, tentativa vã, apenas.
Mesmo que alguns Tribunais Regionais entendam ser razoável a inclusão dos sócios na execução judicial movida pelo fisco e não obtendo frutos na cobrança perante o próprio contribuinte, a pessoa jurídica que praticou o fato tributário, afirmamos que a desconsideração da personalidade jurídica — situação em que os sócios respondem pelas dívidas em valores superiores ao das cotas do capital social que possuem — só pode acontecer se ficar provado o descumprimento de leis ou de cláusulas do contrato social ou ainda excessos nas decisões tomadas, e não apenas por causa da falta de pagamento de impostos.
Mais ainda, mesmo não se encontrando bens suficientes em nome da empresa, não pode haver a inclusão pura e simples dos sócios no pólo passivo, pela chamada responsabilidade secundária. Esta é uma exceção à regra e prevê a responsabilidade para a quitação de dívidas com o patrimônio individual dos sócios de uma sociedade ou seus administradores, dos sucessores ou do cônjuge do devedor. Tal norma, que existe, prevê hipóteses em que os sócios respondem com os próprios bens, somente precedendo da declaração judicial para desconsiderar a personalidade jurídica, dissolvendo a sociedade, para daí então estender a obrigação ao patrimônio das pessoas físicas.
O artigo 50 do Código Civil exige que esteja caracterizado o abuso da personalidade jurídica, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, ou seja, quando não há separação das obrigações e das contas físicas das jurídicas.
Outro ponto forte que devem os empresários se defenderem é quando há acusação da dissolução irregular que normalmente serve de indício para autorizar a providência do redirecionamento da execução ou cobrança. Ledo engano. Por si só esse indício não é o suficiente para tal declaração judicial. Deve o fisco credor demonstrar o efetivo locupletamento indevido dos sócios, seja alienando o patrimônio social e retendo para si tais valores, seja retendo o próprio patrimônio da sociedade, em prejuízo dos credores.
Isso tem de passar pelo processo de cognição exauriente com todas provas nesse sentido – caso contrário, o que se verifica é que a sociedade fracassou e tudo indica que foi fechada, não possuindo bens para o pagamento de suas dívidas, tampouco possuindo sócios com parcos bens sem condições financeiras e sem provas de que houve locupletamento ou má-fé.
Aliás, a boa-fé é regra, a demonstração da má-fé é exceção que deve ser provada pelo Estado. Ou seja, o que vemos no cotidiano é o Fisco buscando forçar o pagamento mediante medidas que de antemão se mostram inúteis, tentando coagir os sócios, mediante o redirecionamento do feito.
Nesse passo, é questão de presuntio hominis, de razoabilidade e de análise do que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC e 5º, LIV, da CF/88, que traduz o devido processo legal, também em seu aspecto substancial), que não se afigura nem ao menos adequada uma medida que vise redirecionar a execução contra os sócios, em relação ao qual não se demonstrou possuir indícios malversação ou mau uso da empresa.

Rubens Leite da Costa – advogado sênior da Argus do Brasil Serviços de Escritório e Apoio Administrativo.